COLUNA

Margareth Botelho

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Escreve sobre atualidades, cotidiano, sentimentos e pessoas.

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As mães da enchente e os políticos sem honra

Foto: Reprodução

O Dia das Mães, nesse domingo (11/5), não foi feminino. Não foi a data amorosa de sempre. Embora criada para atender ao comércio e esquentar as vendas, a data costuma ter um glamour emocional. Mas diferente neste ano, foram 24 horas de contemplação e reflexão. Nas lembranças das mães presenteadas e celebradas ocuparam espaço as mães dos telhados, dos abrigos improvisados, do frio, do medo, das canoas, dos gritos e do leite de fórmula que deu lugar ao peito. Todas elas vítimas da tragédia que atingiu o Rio Grande do Sul. Amor de mãe é assim, não tem barreiras, seja qual for a dimensão do problema. Ser mãe traz consigo a resiliência contínua de quem passou pela indescritível experiência de manter por longos 9 meses suas crias dentro de si.

Enquanto, de um lado, lideranças políticas trabalham por valorizar essas mulheres e todas as outras do país, seja qual for o futuro que constroem com o passar dos dias, uma grande parcela de homens de terno e gravata se dedica a reduzir iniciativas relevantes e femininas. O Brasil é o 5º país do mundo com maior número de registros de violência doméstica. Uma mulher é assassinada a cada 3 horas. Dados como esses são relevantes para conscientizar a população de que é importante, cada vez mais, criar não só redes de afetos, mas também espaços de cuidados legítimos por meio de políticas públicas e institucionais.

E é assim que mulheres, mães e a população como um todo perdem prioridades pelas mãos de políticos que trabalham em causa própria ou de compadres. Por que as mães gaúchas não puderam comemorar seu dia? Simplesmente porque o Legislativo brasileiro nunca foi tão agressivo no desmonte de pautas ambientais. A oposição argumenta que o meio ambiente impede o desenvolvimento econômico e desconsidera dados relevantes sobre aquecimento global e desmatamento no país. Neste momento, por exemplo, parlamentares trabalham para acabar com a Lei de Licenciamento Ambiental. Um desrespeito à natureza que provoca tragédias como a do Rio Grande do Sul. Há quem diga que o Congresso Nacional ajuda o país na área ambiental sim, apenas duas vezes: nos recessos do mês de julho e do final do ano.

Embora o Brasil tenha um Ministério do Meio Ambiente que, autorizado, ousa falar em desmatamento zero e tolerância zero a infratores, o governo federal parece patinar nas conversas com deputados e senadores de oposição e parte da situação. Especialistas não acreditam que se trata de definir orçamentos de diferentes valores para ministérios da área. Desconfianças não faltam àqueles que se preocupam com o estrago que se faz à natureza no país. Nem a lógica de bancada maior, o governo tem em mãos. Basta lembrar que, em absoluta minoria, o Planalto conseguiu aprovar agendas como o arcabouço fiscal, mas se mantém recuado nas negociações de pautas ambientais de extrema urgência.

O desastre ambiental no Rio Grande do Sul teve alertas há mais de 10 anos e, sem ir muito longe, basta lembrar da tragédia de 8 meses atrás que fez vítimas e destruiu casas e obras públicas. Embora com o prenúncio de novas ocorrências, governo federal, estadual e políticos pouco ou nada fizeram. Não houve nem mesmo consenso da bancada federal gaúcha sobre valores que seriam direcionados às questões ambientais através de emendas parlamentares. Gritos isolados pedindo atenção à natureza não foram ouvidos. Propostas e discussões ocorreram intensamente, mas serviram somente para gastar tempo e deixar de novo a céu aberto projetos que, se executados, poderiam reduzir minimamente os efeitos do desastre.

Falta de recursos foi argumento utilizado para justificar a ausência de ações preventivas por lideranças políticas do Rio Grande do Sul e também em Brasília, no Congresso e no Planalto. A crise climática dividida em ondas de calor excessivo e chuvas torrenciais foram ignoradas, assim como projetos para evitar tamanho estrago ganharam gavetas e nem sequer foram lidos e analisados. Agora as contas estão em aberto. Fala-se em cerca de R$ 8,4 bilhões em 446 municípios, montante que se refere apenas ao setor habitacional com 101 mil moradias destruídas. Para reconstrução de obras públicas, como pontes, sistemas de drenagem e pavimentação, o total chega a R$ 1,6 bilhão. Literalmente as águas já gastaram bilhões que poderiam ter sido investidos em obras preventivas ao invés de emergências. Não estão computados nos valores descritos acima os danos pessoais das famílias, como mobiliário, aparelhos eletroeletrônicos, roupas, documentos, livros e veículos.

As mães gaúchas, que não tiveram um domingo tradicionalmente dedicado a elas, querem respostas, cobram atitudes. A lida diária além do trabalho, do esforço descomunal para limpar suas casas, guarda o choro contido de ver tudo coberto por lama ou afundado nos alagamentos. A rotina desconstruída dos filhos, dos maridos, parentes e vizinhos não dá para descrever. Cada uma procura improvisar da melhor forma o que nem de longe pode-se chamar de lar. A elas, muitos domingos de celebrações e de solidariedade. Aos políticos, o desejo de todo o país para que honrem seus mandatos e cumpram suas promessas.

 

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