COLUNA

Adriana Mendes

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Informações de política, judiciário e meio ambiente.

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De Juara para o Brasil: a startup que nasceu de uma revolta

Guilherme Amaral no encontro do Sebrae-MT Foto: divulgação

A história de Guilherme Barbosa Amaral, 27 anos, empresário de Juara, no interior de Mato Grosso, não começou com planos mirabolantes de tecnologia nem com conhecimento prévio de programação. O aplicativo Aonde Ir Passageiro nasceu de uma revolta e de uma oportunidade inesperada.

O empresário contou sua trajetória em um encontro, realizado em novembro, dos “empretecos”, grupo que reúne empreendedores formados pelo curso do Sebrae-MT.

Em 2018, após uma temporada no Canadá, Guilherme desembarcou na rodoviária de Juara. Ele e uma amiga tentaram dividir um táxi porque moravam em endereços próximos. O motorista recusou: queria fazer duas viagens para lucrar mais.

“Falei: então deixa a gente na casa dela, vou a pé. Ele disse que não levava”, conta. Minutos depois, um amigo passou e ofereceu carona. Ao ouvir o relato, provocou: “Você não manja de computador? Por que não cria um aplicativo igual ao Uber?”.

A ideia ficou ecoando. Mesmo sem formação específica na área, decidiu estudar. Pesquisou, testou, enfrentou a parte técnica e passou quatro meses desenvolvendo um MVP, a versão mais simples e viável de um produto.

O aplicativo tinha localização, um botão para chamar o carro e tarifa mínima de R$ 8. “Era o básico do básico do básico”, relembrou. Lançado o aplicativo, vieram os primeiros meses quase solitários: duas viagens no primeiro mês e dez no segundo.

A virada veio no terceiro mês, durante a Acrivale, o maior evento de rodeio da cidade. Guilherme investiu tudo o que tinha, cerca de R$ 25 mil, em uma tenda, camisetas, brindes, panfletagem e divulgação. A equipe inicial tinha apenas quatro motoristas. Um dos carros era o seu Pálio, sem ar e direção. A procura explodiu. “Era mais de mil pessoas querendo ir com a gente. Congestionou”, comentou, rindo.

Sem dar conta da demanda, pegou o microfone emprestado de uma barraca na feira e avisou: “Quem tiver pressa, vá com outra empresa. Quem puder esperar, a gente vai atender”. Eles cobravam R$ 8 a corrida, enquanto os concorrentes cobravam R$ 50.

O caos virou oportunidade. No dia seguinte, Guilherme foi à rádio pedir motoristas. Ofereceu cadastro gratuito e 100% do valor das corridas para os parceiros. A meta era 30 motoristas. “Às cinco da tarde eu já tinha 38”, lembra. Ainda assim, a empresa não conseguiu atender toda a demanda, mas deu um grande passo.

O impacto para os motoristas foi imediato. César, um dos primeiros cadastrados, vendeu a moto, comprou um carro e apostou na plataforma. “Ele fez R$ 900 numa única noite. Está comigo até hoje”, diz o empresário.

A consolidação da marca também trouxe resistências. No terceiro dia de evento, fiscais da prefeitura, taxistas e vereadores apareceram para tentar barrar a operação. A pressão, na avaliação de Guilherme, só reforçou o que já estava claro: a população queria alternativas e havia espaço para inovação.

O empresário se orgulha de ter transformado um problema cotidiano em negócio. “Foi ali que veio a virada de chave. A população conheceu a empresa e a empresa conheceu sua própria força”, resume.

De um táxi recusado na rodoviária a um aplicativo que movimenta motoristas e passageiros. Hoje, o Aonde Ir tem 41 franqueados, opera em 38 cidades e já conta com 213 cidades com negócio fechado em todo o país.

Em entrevista ao eh fonte, Guilherme contou sua trajetória e se emocionou ao falar da família e da realização do sonho de ser pai.

O App já na 3º geração e o primeiro carro do empresário

Em que momento você percebeu que o aplicativo poderia crescer além de Juara?

No começo, eu não pensava em expandir. A ideia nasceu de uma revolta: queria que minha cidade tivesse uma segunda opção de transporte, com qualidade e preço justo, como quando eu estava no Canadá e usava Uber e Lyft. A ideia de franquear partiu de um colega da área de expansão que pediu para levar o app para a cidade dele. O app não estava nem preparado para franquia, era bem simples. A virada real veio no Empretec, que mudou minha visão como empresário.

O que o curso representou para o negócio?

Foi um divisor de águas pra mim. De todos os tipos de curso que já participei, o Empretec foi o que melhor me direcionou. Olha, eu não estou sendo pago para falar isso. Em nenhum outro curso tive um direcionamento tão claro. Saí de lá com uma meta ousada: chegar a 40 franquias até 30 de dezembro daquele ano. E batemos 55 franquias.

Isso foi em que ano?

Em 2023. Hoje estamos com operação em 213 cidades, porque trabalhamos com sistema de multifranqueado. Muitos compram uma cidade e, depois, as cidades vizinhas para ampliar o resultado.

Qual estado tem mais franquias?

São Paulo.

O que você diria para quem vai começar a empreender?

Empreender é “mastigar vidro olhando para o abismo”. Porque, na teoria, aqui parece pouco tempo contando uma história, mas foram seis anos trabalhando sem parar. Até hoje eu não paro. Nenhuma empresa toca sozinha. Uma orientação que eu dou: se você fizer com gosto, com garra e pensando no seu futuro, o dinheiro é consequência. Hoje eu não trabalho, eu me divirto. São mais de 50 mil famílias que dependem do aplicativo direta ou indiretamente. É isso que me anima.

Como é sua relação com o dinheiro?

Você tem que saber administrar. Aprendi que, quanto mais você corre atrás dele, mais ele corre de você. É como tentar pegar uma galinha: você joga milho, planta, trabalha bem, cria estratégia para que automaticamente ela venha até você. Não quer dizer que tem de deixar de lado — ele é muito importante. Mas se pensar só em lucro, não vive.

Você é de Juara, interior de Mato Grosso. Dá para crescer de qualquer lugar?

Quem define o limite é você.

Como é a relação com concorrentes como Uber e 99?

Cada um tem seu mercado. Nós também temos o nosso. O Aonde Ir tem como diferencial a taxa melhor para o motorista e o preço mais justo para o passageiro. Temos uma balança equilibrada, baseada em estudo de mercado para cada região.

Qual é o maior desafio com relação aos concorrentes?

É o marketing. Quem é responsável é o franqueado; ele precisa ter caixa para investir.

Já houve algum problema com os concorrentes?

Sim. Tivemos um grande BO recentemente com o sistema de um concorrente grande, que usava uma tecnologia chamada overlay block. O que é isso? Imagine que você quer que a viagem apareça para você, mas esse aplicativo não deixava a viagem do Aonde Ir, e de outros aplicativos, aparecer. Ele meio que segurava o aplicativo: colocava uma parede, uma grade, uma “cadeia”, trancava, e a gente não conseguia mostrar nada para o motorista.

Usando tecnologia…

Esse aplicativo fazia isso no celular do motorista. Tivemos muita dificuldade. Até descobrir, foi muita dor de cabeça. Um colega me falou: “Cara, você sabia que o aplicativo tal bloqueia os aplicativos de mostrar corrida?”. Precisei testar em outra cidade, porque em Juara não tinha esse problema. Tivemos de procurar tecnologia na China, importar para o Brasil e colocar no Aonde Ir. O que essa tecnologia faz? É como um trator gigante que vê aquela parede e começa a arrebentar tudo.

Mas como você resolveu isso?

Aí já é segredo do negócio, mas conseguimos resolver. A empresa (Aonde Ir) tem um valor a mais hoje por causa dessa tecnologia também.

Algum outro ponto em relação aos concorrentes?

O marketing. É o franqueado que cuida disso. Se ele não tiver caixa, a cidade não deslancha. Por isso evitamos expandir para lugares onde o franqueado não consegue sustentar o investimento inicial.

Como você enxerga o futuro da mobilidade?

É uma necessidade humana. O ser humano não fica parado. Vejo que é um mercado bilionário. Quando o Aonde Ir chega a uma cidade, dependendo da região, se captarmos 3% ou 4% dela, já é um mercado milionário.

E o Guilherme arquiteto?

Usei o curso para construir minha casa. Foi uma jogada muito boa, e foi uma parte da minha vida que, querendo ou não, não perdi. Foi aprendizado.

Quais os próximos planos?

Um dos planos é o Aonde Ir Sulamérica, projeto para iniciar em 2028, no primeiro semestre. A ideia é começar pela Argentina e depois avançar para outros países. Estamos internacionalizando. Já estamos preparando investimentos e documentação bancária para esses países. É preciso antecipar problemas. É um projeto-base de dois anos.

E como você concilia tudo isso com a vida pessoal?

Minha família vem em primeiro lugar, sempre. Se você não tiver uma pessoa que te apoia, você não tem nada. De que adianta ter de tudo, ter o mundo, se não tem uma família, um filho para abraçar? É assim para mim.

Qual é o seu maior sonho?

Eu já realizei meu sonho grande e não é da empresa: é o de ser pai. O Otávio mudou muito a minha vida. Eu descobri uma época que não poderia ser pai, coloquei na mão de Deus. Ele foi um milagre.

 

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