COLUNA

Sônia Zaramella

soniaz@ehfonte.com.br

Relatos e fatos, pessoais ou não, do passado e do presente de Cuiabá e de Mato Grosso.

Banner
Banner

Eleições cuiabanas de antes e de agora

Foto: IP/Canva

 

Para delimitar diferenças de forma rápida, se diz que história é o passado e que jornalismo é o presente. Em várias circunstâncias, o jornalismo se vale da história, assim como a história se baseia no trabalho jornalístico para construir suas narrativas e relatos. Convicta de que o jornalismo pode e deve ser guiado pela história, usarei isso para tratar das eleições municipais de 1988 e de 2024 em Cuiabá.

O pleito de 1988 é um dos mais simbólicos da política cuiabana contemporânea. Isso porque o então candidato favorito à prefeitura da capital Roberto França (PTB) perdeu para Frederico Campos (PFL), ex-prefeito nomeado (1966) e ex-governador nomeado de MT (1978), o que surpreendeu o eleitorado.

Foi a primeira vitória de Campos pelo voto direto, o que o fez retornar ao poder. Em tentativa anterior, nas eleições de 1986 ao governo, foi derrotado por Carlos Bezerra. Ainda sobre 1988, outra marca desse pleito foi a profissionalização das campanhas políticas na cidade.

Já as eleições de 2024, em seu primeiro turno, foram marcadas pela perda de credibilidade das pesquisas eleitorais, visto que a maioria dos institutos cravou o candidato Eduardo Botelho (União) como primeiro colocado, sendo a segunda vaga disputada entre Abílio Brunini (PL) e Lúdio Cabral (PT). Erraram!

A exceção ficou com o Atlas/Intel que, em 1º de outubro, antecipou o cenário de segundo turno entre Abilio e Lúdio na capital e, no sábado, dia 5, sinalizou que Abilio teria 40,5% dos votos válidos e Lúdio, 32%.

Como correspondente do Correio Braziliense (Brasília/DF), acompanhei as eleições de 1988 em Cuiabá e penso que cinco textos meus publicados no jornal, à época, podem resumir a disputa municipal, as formas de fazer campanha e a apuração manual dos votos naquele tempo.

Em comum com o pleito de 2024, o de 1988 teve, entre outros pontos, as sondagens eleitorais, o apoio dos gestores públicos, a participação dos caciques partidários, além do marketing político. No lugar da internet, o telefone teve papel importante naquele ano.

No dia das eleições de 1988 (15 de novembro), as pesquisas nacionais sinalizavam que os indecisos, estimados em 16%, definiriam a disputa em Cuiabá, considerando os índices próximos entre os candidatos – Roberto França (PTB/PDT/PDC) 29%, Frederico Campos (PFL/PL) 28% e José Meirelles (PMDB/PCB) 24%. Porém, o ambiente na cidade sugeria que Roberto França estava disparado na frente, na preferência dos eleitores. Radialista, ele era popular em Cuiabá, onde havia sido vereador, depois deputado estadual. O impacto de sua derrota foi enorme.

Em 1988, no quesito apoio, a disputa em Cuiabá reuniu o prestígio político dos tradicionais grupos de MT, além do envolvimento da máquina pública. Apoiando Meirelles estavam os gestores da época – o governador Carlos Bezerra e o prefeito de Cuiabá, Dante de Oliveira. Já com Frederico estava o grupo político pefelista do ex-governador Júlio Campos. Sem caciques de peso, França tinha o apoio popular e de dirigentes de órgãos federais, como a LBA e o Incra.

Quanto ao marketing eleitoral, a campanha de Frederico Campos, então sob o comando do publicitário Mauro Cid – falecido em agosto deste ano – trouxe como novidade em 1988 o Linha Direta, um sistema telefônico por meio do qual o eleitor conhecia as propostas do candidato, suas prioridades e biografia, entre outras informações.

Com três semanas de funcionamento, o sistema teve uma média de 150 telefonemas ao dia. “A gente recebe telefonemas com palavrões e xingamentos, mas a maioria é de pessoas sérias”, contou, naquele tempo, o pessoal da comunicação da campanha de Campos.

De volta a 2024, o panorama recente está na cabeça dos eleitores. Quatro candidatos entraram na disputa em dois turnos. Eduardo Botelho (União) e Domingos Kennedy (MDB) ficaram para trás, enquanto Lúdio Cabral (PT) e Abílio Brunini (PL) seguem para a reta final.

A máquina pública e o prestígio do governador Mauro Mendes não foram capazes de levar o candidato do União ao segundo turno. As pesquisas eleitorais caíram em descrédito. O marketing foi impulsionado pela comunicação digital – o que favoreceu Abílio, o candidato que mais fez uso das redes sociais. E a polarização entre PT (partido do presidente Lula) e PL (partido do ex-presidente Bolsonaro) se mantém firme e forte na disputa pela prefeitura de Cuiabá.

De 1988 para 2024, o eleitorado cuiabano passou de 177.254 para 445.050. Agora há mais partidos políticos e o uso das redes sociais proporcionado pelo avanço digital abrange a quase totalidade dos votantes. As políticas econômica, social, cultural e de mobilidade urbana de Cuiabá são mais complexas e desafiadoras.

Enfim, o cenário diverso e plural da capital mato-grossense – incluindo seu meio ambiente prejudicado pelas mudanças climáticas – pede, no momento, um executivo ágil e competente. Todavia, pelo jeito que as coisas estão, não se espera nenhum milagre.

O mais provável é que o candidato vencedor em 2024 fique tentado a repetir a fala do vitorioso de 1988: “Vou receber o caos”, afirmou Frederico Campos ao comentar o resultado das eleições e já antevendo a problemática situação que encontraria na prefeitura de Cuiabá daquele tempo.

Pelo sim, pelo não, como a administração de Cuiabá e a vida dos cuiabanos dependerão, nos próximos quatros anos, do vencedor do segundo turno das eleições de 2024, minha torcida é pelo candidato mais qualificado, sereno, com visão social e que mantém excelente relacionamento com o governo federal. Boa sorte para nós!

 

P.S 1: Cuiabano, Frederico Campos faleceu na capital, aos 93 anos, em fevereiro de 2021.

P.S 2: Gratidão ao jornalista Marcy Monteiro, ex-aluno e talentoso colega, que me ajudou a recuperar os textos do Correio Braziliense.

 

Compartilhe

Assine o eh fonte

Tudo o que é essencial para estar bem-informado, de forma objetiva, concisa e confiável.

Comece agora mesmo sua assinatura básica e gratuita:

Mais Colunas