COLUNA

Regina Alvarez

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Em causa própria

Recentemente, voltou ao noticiário o tema da desoneração da folha de salários com a decisão liminar do ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, de suspender dispositivos da lei 14.784/2023, que prorroga o benefício até 2027 para 17 setores da economia . A liminar foi concedida após o governo recorrer ao Supremo questionando a constitucionalidade da lei. No momento, a decisão está sendo julgada pelo plenário virtual do STF e já conta com cinco votos favoráveis.

Relembrando, pois o assunto já foi tratado neste espaço, o incentivo foi proposto em 2012 , durante o governo de Dilma Rousseff, para aliviar a carga tributária das empresas em troca do aumento de empregos. Os setores beneficiados ganharam a opção de trocar a contribuição previdenciária patronal de 20% sobre a folha de salários por uma alíquota de 1% a 4,5% sobre a receita bruta da empresa, o que, na prática, significa pagar menos impostos.

Só que os empregos nesses setores não aumentaram conforme prometido, como mostra estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA. No período de 2012 a 2022, os setores com folha desonerada reduziram sua participação no total de pessoas ocupadas, de 20,1% para 18,9%. E os empregados com carteira assinada caíram de 22,4% para 19,7% nos mesmos segmentos.

Diante desse quadro e das dificuldades que enfrenta para equilibrar as contas, o governo posicionou-se contra a prorrogação do incentivo, que acabaria em dezembro de 2023. No final do ano, o presidente Lula editou uma medida provisória que previa a retomada gradual da carga tributária dos 17 setores.

O Congresso reagiu e aprovou na sequência a Lei 14.784/2023, que, além de prorrogar a desoneração desses setores, diminuiu para 8% a alíquota da contribuição previdenciária incidente sobre a folha de pagamento dos municípios. Lula decidiu então vetar integralmente o texto, mas os deputados e senadores, com amplo apoio dos setores envolvidos e da mídia, derrubaram o veto ainda em 2023.

Na liminar que suspendeu a lei, o ministro Zanin destaca que a Constituição determina que para a criação de uma despesa obrigatória é necessária a avaliação do seu impacto orçamentário e financeiro e alerta que a manutenção da norma poderá gerar um desajuste significativo nas contas públicas. A renúncia fiscal decorrente da desoneração da folha é estimada em pelo menos R$ 9 bilhões por ano, recursos de impostos que deixam de entrar nos cofres do Tesouro e poderiam ser usados na área social ou em investimentos prioritários, por exemplo.

O preceito mencionado por Zanin ao  conceder a liminar é reforçado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Ela prevê que a criação de uma despesa deve ser sempre acompanhada da indicação de onde sairá a receita para custeá-la. No caso de uma renúncia fiscal, deveria ter sido indicada a fonte de receita para compensá-la, o que não foi feito. É um princípio básico para qualquer gestor que busque o equilíbrio das contas públicas, repetido à exaustão pela mídia quando trata dos gastos do governo.

No caso da desoneração da folha, entretanto, os argumentos técnicos e jurídicos que sustentaram a decisão do veto em 2023 e a recente liminar do ministro do STF foram desconsiderados pelos principais veículos de comunicação.

O destaque desse assunto na mídia tem sido muito grande, mas sempre com viés de crítica ao governo e à decisão de Zanin. Não há qualquer reflexão sobre o impacto fiscal da medida, nem espaço para acolher argumentos que contradizem a narrativa de que os 17 setores econômicos respondem pela maior parte dos empregos criados no país, nos últimos dez anos.

O setor de comunicações é um dos beneficiados com a desoneração da folha, o que exigiria uma postura ainda mais equilibrada da mídia ao tratar do assunto, mas não é o que se vê no noticiário. A conclusão é que, nesse caso, os veículos de comunicação estão defendendo seus próprios interesses e não os interesses da sociedade, como recomenda o bom jornalismo.

 

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