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ALMT desvia função de emendas para gastos internos

 

Por Adriana Mendes

A Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) tem recorrido a emendas parlamentares para cobrir parte de suas próprias despesas de custeio (gastos do dia a dia, como contratos de serviços e manutenção da estrutura). Além do duodécimo, que é a parcela do orçamento estadual destinada ao Legislativo, a Casa usa recursos de emendas de lideranças partidárias para essas despesas. Em 2023, foram R$ 64,8 milhões pagos dessa forma, e em 2025 o valor já soma R$ 50 milhões.

Especialistas consideram incomum essa prática, já que emendas são destinadas a investimentos em saúde, educação, cultura, obras e melhorias em infraestrutura. O uso para manter o funcionamento da máquina legislativa levanta questionamentos sobre a gestão dos recursos públicos. O dinheiro foi usado para pagar conta de energia, agências de publicidade, contratos e até impostos.  O eh fonte já revelou também o uso de emendas para custeio do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT) e do Tribunal de Justiça (TJMT). 

O duodécimo garante que os órgãos autônomos não dependam da vontade do Executivo para funcionar, reforçando o princípio da separação e independência dos poderes. Em 2025, o valor total do orçamento da ALMT é de R$ 923 milhões, segundo informações da Secretária de Fazenda de Mato Grosso. 

O advogado Sidney Neves, presidente da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), explica que as assembleias já contam com dotação própria no Orçamento, o que garante a execução de suas despesas. 

“A  Assembleia receber duodécimo é uma previsão constitucional, está estabelecido no Orçamento. Não tem sentido, nunca ouvi falar de suplementação de orçamento de uma assembleia, o uso de emendas seria uma suplementação. É a primeira vez”, afirmou.

A explicação da ALMT é que o pagamento é feito com emendas de natureza técnica, chamadas de “emendas de remanejamento”, utilizadas para corrigir distorções ou inadequações na fase de fixação orçamentária.

 “Essas emendas de remanejamento têm como objetivo garantir a adequada execução orçamentária da Casa, diante de demandas não previstas ou subestimadas na LOA, como ocorre, por exemplo, com despesas de comunicação institucional, modernização tecnológica ou serviços estratégicos”, informou a assessoria. 

Um dos problemas apontados é a falta de regras claras para aplicação das emendas e prestação de contas. 

“Se o Supremo não fizer a interpretação correta, de que o Orçamento deve ser gerido e executado pelo poder Executivo, a gente vai chegar em um nível de muita dificuldade sobre o aspecto da própria gestão orçamentária”, avalia Neves. 

O presidente da Abradep destaca também que existe uma ligação direta entre orçamento público e as eleições. Normalmente, o deputado que destina recursos para determinado município ajuda na reeleição do prefeito e, em contrapartida, esse prefeito passa a ser “cabo eleitoral do deputado”. Assim, cria-se “um ciclo que se mantém com o uso do dinheiro público”, um círculo vicioso para manutenção do poder. 

Maiores repasses

Entre as dez empresas que mais receberam recursos por meio de emendas,  em primeiro está a Infortouch, responsável por serviços de apoio logístico em eventos institucionais. A ALMT também pagou, em 2023,  valores acima de R$ 5 milhões a agências de publicidade como a Zimmermann Publicidade e Propaganda (Z3 Publicidade) , a DMD Associados e a Ziad A. Fares (ZF Comunicação).

O pagamento é feito por meio das chamadas emendas de lideranças partidárias, que não têm previsão legal específica na legislação orçamentária. Elas estão fora da estrutura das emendas impositivas e carecem de regras mais claras.

Questionada sobre o pagamento, a ALMT informou que “em determinados exercícios, a ampliação das atividades parlamentares, a implementação de novos programas de comunicação institucional, os projetos de modernização tecnológica e as ações voltadas ao fortalecimento da transparência pública demandaram remanejamentos orçamentários ou a alocação de recursos complementares”.  

Apesar de alegar investimento em transparência, as informações sobre investimentos em publicidade não são divulgadas de forma clara e acessível no portal do Legislativo.

Aumento no valor das emendas 

Os valores pagos em emendas parlamentares pela Assembleia Legislativa mais do que dobraram nos últimos quatro anos. Em 2021, foram desembolsados R$ 198 milhões, enquanto em 2024 o montante chegou a R$ 556 milhões — um crescimento de 181% no período. 

O maior salto ocorreu entre 2022 e 2023, quando os pagamentos passaram  de R$ 221 milhões para R$ 419 milhões, aumento de 89% em em apenas um ano após a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que elevou para 2% a fatia do orçamento estadual destinada aos repasses dos deputados. 

A medida provocou tensão com o governador Mauro Mendes (União), que levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, a Corte manteve a validade da emenda, impondo apenas a obrigatoriedade de que 50% dos recursos sejam destinados à saúde. A regra passou a ser cumprida em 2024.

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