COLUNA

Sônia Zaramella

soniaz@ehfonte.com.br

Relatos e fatos, pessoais ou não, do passado e do presente de Cuiabá e de Mato Grosso.

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Leverger e Barão, com Mimoso junto, não são pobres, governador!

O distrito de Mimoso, terra de Rondon, o maior mato-grossense de todos os tempos, está a 85 km de Santo Antônio de Leverger e a 56 km de Barão de Melgaço. Nas perspectivas histórica e cultural, tanto Mimoso quanto Leverger e Barão são importantes para Mato Grosso. Essa relevância sobressai ao considerar que o conjunto das duas cidades mais o distrito tem um valor ambiental apreciado e reconhecido pelos mato-grossenses e visitantes brasileiros que buscam lazer nessa região pantaneira.

Leverger e Barão se destacam ainda mais porque são rotas que levam ao celebrado Mimoso, que é o lugar onde Rondon nasceu. Saindo de Cuiabá, também se chega rapidamente ao distrito. Juntos, Mimoso, Leverger e Barão mantêm (e resistem) há séculos a função de guardiões do Pantanal, afastando, do jeito que podem e conseguem, as ameaças e as iniciativas predadoras do bioma no qual estão inseridos. O rio Cuiabá margeia Barão e Leverger. Em Mimoso estão as baías de Chacororé e Siá Mariana, o rio Mutum e o Memorial Rondon.

É preciso considerar tal contexto para repelir a pecha de que os municípios são “atrasados” e “pobres”. Longe disso. A riqueza de Mimoso está na memória de Rondon e a de Leverger e Barão está no viés ambiental. São riquezas naturais e culturais tão relevantes quanto às monetárias. Desse modo, o distrito e as cidades, incluindo suas populações, têm que ser valorizadas e cuidadas por projetos e ações dos governos municipal, estadual e federal que respeitem suas qualidades. Precisam de apoio e proteção, não de mudança de vocação na economia.

Barão e Leverger têm na pesca, na agricultura de subsistência e na pecuária de pequeno porte suas bases financeiras exatamente porque se localizam na região pantaneira, não podendo, por conta dessa condição ambiental, receber empreendimento vultoso que represente risco ao bioma. No entanto, semanas atrás, no afã de defender a famigerada Lei da Pesca que proíbe a atividade por cinco anos nos rios mato-grossenses (atualmente sub judice), o governador Mauro Mendes desconsiderou tais especificidades e atacou os municípios:

“Quais as duas cidades de MT cuja atividade econômica está mais focada na pesca. Quais são elas? Vou ajudar vocês: Barão de Melgaço e Santo Antônio de Leverger, correto? Qual é o IDH dessas cidades? Qual é a capacidade de gerar riqueza dessas cidades ao longo desses anos? Isso mostra que essa atividade econômica, no auge dela, quando ainda tinha peixe do rio Cuiabá em abundância, não foi capaz de produzir riqueza e tornar essas cidades prósperas para gerar riqueza para esses cidadãos (os pescadores)”.

Prosseguiu o governador: “Quem defende essa atividade (pesca artesanal) está defendendo o atraso, a pobreza que essas cidades viveram esses anos todos. Digam que isso não é verdade. Olhem para Barão do Melgaço, olhem para Santo Antônio, cidades que tiveram e têm muita dificuldade. Essa atividade econômica nunca gerou riqueza em lugar nenhum do mundo”. O patrimônio cultural da região e o quê fariam os pescadores de lá para sobreviverem sem a pesca Mauro Mendes não mencionou, numa demonstração de desconhecimento e insensibilidade.

Só o resultado financeiro, de fato, interessa à gestão? Cuiabana que sou, com infância e adolescência marcadas pelas idas da capital às vizinhas Leverger e Barão para passeios impagáveis, tomei as dores dos melgacenses e dos santo-antonienses e associei essas falas do governador a um desprezo descabido. Além disso, entendi como uma mostra de ignorância cultural e ambiental em relação a Mato Grosso. “Fiquei indignado, Leverger é polo turístico com suas praias e sua gastronomia no ramo da peixaria”, reagiu o santo-antoniense Gerson.

Recorro a Marechal Rondon, patrono das comunicações no Brasil e nascido em 1865, em Mimoso, que é distrito de Leverger e abriga um memorial que o homenageia, para imaginar como se sentiria o conterrâneo em relação ao discurso do governador. Ficaria triste, lamentaria ou rechaçaria? Como um dos maiores exploradores da história mundial, Rondon talvez só suspirasse e fosse em frente sem olhar para trás.

Acabar com a atividade da pesca não é saída para a ‘pobreza’ desses municípios. Mas sim debater alternativas econômicas, como o turismo, por exemplo, além de compreender que a riqueza cultural das localidades pode gerar dinheiro para suas comunidades. Leverger e Barão são parte da região turística do pantanal e destinos procurados pela gastronomia, praias, baías e pesca no rio Cuiabá.

Deve-se considerar também que Mimoso abriga o Memorial Rondon, espaço que reverencia o explorador mato-grossense, expressando seu trabalho que incluiu expedições, instalação de linhas telegráficas, construção de estradas, além do estabelecimento de contatos pacíficos com etnias indígenas. Hoje, no Brasil, Rondon empresta seu nome a rodovias, ruas, museus, cidades e a um estado, Rondônia, além do Aeroporto Internacional em Várzea Grande. É uma memória rica a ser mantida e que atrai a curiosidade de brasileiros e de pesquisadores do mundo.

O Memorial está fechado ao público desde 19 de maio de 2023, para reforma do piso. Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, o projeto, no valor de R$ 5 milhões, seguiu para licitação pela Secretaria de Infraestrutura e Logística. Já arrematando, não se deve esquecer que o projeto do Memorial foi iniciado em 1997, na gestão de Dante de Oliveira; as obras começaram em 2001, mas a inauguração ocorreu só em 2016 na gestão de Pedro Taques.

Mesmo com todo esse vai-e-vem, conforta distinguir que os cuiabanos Dante e Taques foram os governadores de Mato Grosso que, ao se empenharem na construção do Memorial, honraram a memória do mimoseano Rondon e valorizaram Barão e Leverger. Ainda bem!!

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