COLUNA

Francisca Medeiros

francisca@ehfonte.com.br

Informações que unem o campo e a cidade.

Banner
Banner

Sustentabilidade no pódio

Grandes eventos causam impactos ambientais e existe metodologia para se medir o estrago, traduzido pelas emissões de gás carbônico. A organização da Olimpíada de Paris prometeu reduzir pela metade a pegada dos jogos comparada à média de Londres em 2012 e do Rio em 2016, que atingiram 3,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente.

A metodologia do inventário das emissões foi criada em 2008 pelo Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC). O Comitê Olímpico Internacional (COI) identificou as principais fontes de emissão e tomou medidas para reduzi-las. Alguns exemplos são a instalação de painéis solares, o plantio de árvores, a criação de mais ciclovias e a ampliação das linhas de trem.

Esta Olimpíada vai sediar mais de 800 eventos esportivos, acomodar e transportar 15 mil atletas e servir 13 milhões de refeições. A preferência foi pela adoção de menos plástico de uso único para alimentos e bebidas. Durante os jogos, deverão circular 15 milhões de turistas.

O governo francês foi comedido na construção de novos equipamentos, que se resumiu a um local para as competições, o Centro Aquático, com design inovador que consome menos energia, gerada por um parque fotovoltaico. A forma como os côncavos se enquadram na estrutura em madeira ajuda no sequestro de carbono. O volume de ar a ser aquecido no centro é reduzido em 30%, diminuindo o gasto de energia em 20%. E os assentos foram construídos com tampas de garrafas plásticas recicladas.

O site do Centro das Indústrias Exportadoras de Madeira (Cipem-MT), inclusive, destaca a importância do uso de matéria-prima renovável nesta construção. Foram 29 mil m3 de madeira com capacidade de armazenar 29 milhões de toneladas de carbono.  O centro aquático ficará como legado para a população de Seine-Saint-Denis, bairro ao norte de Paris, onde, segundo as autoridades francesas, metade das crianças não sabe nadar.

Na vila olímpica, as camas de papelão dos atletas não são novidade, já foram usadas em Tóquio 2020. Agora, geraram comentários nas redes sociais e foram chamadas de ‘antissexo’. Na verdade, elas são bem firmes, resistentes e práticas, podem ser montadas em 15 minutos. As mais de 16 mil camas serão recicladas após os jogos e os colchões e travesseiros, doados.

A vila foi construída com um sistema de climatização que diminui a temperatura entre 6°C e 10°C em relação ao ambiente externo. É a tecnologia de geotermia que usa correntes de vento conectadas por tubulações ao rio Sena. Mas as altas temperaturas no auge do verão levaram delegações a pressionar o comitê olímpico que acabou alugando climatizadores. A delegação brasileira de 270 atletas recebeu 130 unidades.

No esforço de descarbonização, o governo francês financiou o plantio de árvores em quatro projetos em diferentes regiões do país. E fez investimentos também fora da França. São nove projetos na linha do Equador de compensação voluntária de carbono que trazem impactos positivos para a população e que cumprem os critérios da Ademe, a agência de transição ecológica francesa.

A obra mais grandiosa e que deixará o maior legado da Olimpíada é a despoluição do rio Sena. Com 780 quilômetros de extensão, o trecho urbano parisiense do rio está fechado ao público há mais de um século, desde 1923.

A rigor, as medidas de limpeza vêm desde a década de 1990, quando a União Europeia adotou uma legislação sobre as águas residuais urbanas, que são fonte de poluição dos rios. Primeiro foi feita a modernização das redes de tratamento de água. Em 2015, veio o plano de tornar o rio balneável, com ações para limpar o Sena e o seu afluente, o Marne, até torná-los limpos para os jogos de agora. Foram feitas ligações de milhares de habitações à rede de esgotos, incluindo barcaças, que antes jogavam resíduos não tratados no leito.

A campanha de limpeza e descontaminação custou mais de US$ 1,6 bilhão (R$ 9 bilhões). O ato simbólico para mostrar o resultado foi o mergulho da prefeita de Paris, Anna Hidalgo, acompanhada por Tony Estanguet, chefe do Comitê Olímpico de Paris, a poucos dias do início dos jogos. A prefeita prometeu abrir o Sena ao banho em 2025. A jusante do rio, que era considerado biologicamente morto, já são encontradas 36 espécies de peixes.

O Sena, além de funcionar como uma avenida líquida da capital francesa, tem muita importância na logística de transporte do país. Em todo seu trajeto passam 20 milhões de toneladas de mercadorias por ano, o equivalente ao transportado por 800 mil caminhões.

Os organizadores querem deixar um legado concreto, dando segunda vida para móveis e equipamentos usados nos jogos. Por esta série de medidas, Paris 2024 tem sido considerada a mais ambientalmente sustentável de todos os tempos.

Mas também há críticas ao evento, considerado excludente para parcelas da população. Foi denunciado, por exemplo, o deslocamento de milhares de pessoas em situação de rua, uma medida que teria sido tomada para ‘embelezar’ a cidade. Entidades estimam que cerca de 12,5 mil pessoas pobres foram removidas de Paris e Seine-Saint-Denis e levadas para abrigos temporários. As autoridades negam que tenha sido uma ‘faxina social’ e dizem que se trata de uma política habitacional permanente de governo.

Também não é unanimidade o deslocamento do surf para o Taiti, a mais de 15 mil quilômetros da capital francesa. Na aldeia de Teahupo’o foi construída na água uma grande torre de alumínio para os juízes e o temor é que haja prejuízos aos corais.

A meta de ter número igual de atletas homens e mulheres ainda não foi alcançada nestes jogos. No total serão, pelo menos, 100 homens a mais. O maior desequilíbrio está no hipismo, tênis, atletismo e natação. Na delegação brasileira, porém, elas são maioria, ocupando 55% das 276 vagas.

Esta é a terceira vez que Paris recebe os jogos olímpicos e a expectativa é que o maior evento esportivo do mundo brilhe também pela valorização da liberdade, diversidade e respeito à natureza. E que os valores olímpicos  – igualdade, equidade, justiça, respeito pelas pessoas, racionalidade, compreensão, autonomia e excelência – reverberem para além do esporte.

* Os textos das colunas e dos artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do eh fonte

Compartilhe

Assine o eh fonte

Tudo o que é essencial para estar bem-informado, de forma objetiva, concisa e confiável.

Comece agora mesmo sua assinatura básica e gratuita:

Mais Colunas