Porque é tão difícil reduzir o plástico no mundo
18 de agosto de 2025
Diminuir o uso de plástico ainda não está nas preocupações diárias da maioria das pessoas. E não é só descompromisso ambiental, é quase impossível se livrar totalmente do material que desde a década de 1950 se tornou onipresente. Mas a poluição do plástico chegou a tal ponto que coloca em risco a saúde humana, a biodiversidade e os ecossistemas. E a reversão dessa situação exige mais que esforços individuais, depende de políticas públicas nacionais e de acordos entre países. E as notícias não são boas porque fracassou mais uma tentativa de se firmar o Pacto Global do Plástico.
Esse tratado patrocinado pela ONU tem o objetivo de reduzir a produção de plástico, principalmente o de uso único, e promover a troca por alternativas reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis. Na última sexta-feira (15), em Genebra, na Suíça, as tratativas foram encerradas sem consenso entre os representantes de 184 países que se viram diante do impasse de restringir a produção ou se concentrar apenas em ações de gerenciamento dos resíduos, como a reciclagem.
Países produtores de petróleo, como Estados Unidos, Arábia Saudita e Kwait, defenderam a segunda opção porque a produção de plásticos, que provém dos combustíveis fósseis, é uma atividade de peso em suas economias.
A grande maioria dos países, em torno de 100, queria medidas mais impactantes de redução da produção na origem. A postura do Brasil foi considerada conservadora e até omissa por algumas entidades. O WWF elogiou, com ressalvas, a participação do Brasil, que defendeu uma transição justa e o reconhecimento do papel dos catadores de material reciclável.
Dados divulgados pela Coalizão Vida Sem Plástico, uma rede de mais de 15 organizações brasileiras, revelam que o Brasil é o maior produtor de plástico da América Latina e é o oitavo maior poluidor do planeta. Produz cerca de 7 milhões de toneladas de plástico por ano e, deste volume, 3 milhões de toneladas são do tipo de uso único. Usado em embalagens, produtos descartáveis, roupas, utensílios e produtos hospitalares, o plástico de uso único é uma das principais fontes de resíduos sólidos do planeta.
O Brasil ainda não tem uma lei que limite a produção dos plásticos mais poluidores, enquanto 141 países já criaram normas com diferentes graus de restrição aos itens facilmente descartáveis na natureza.
Em abril deste ano, durante uma audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado, o professor Ítalo Braga de Castro, pesquisador do Instituto do Mar da Unifesp, defendeu que o Brasil resolva internamente o problema da poluição por plásticos, independentemente da aprovação do Tratado Global. “Nós somos um dos 17 países megadiversos do planeta. Então, temos um interesse maior do que o dos demais países. Por isso, devemos nos antecipar, a exemplo do que já é feito na Europa”, argumentou.
O pesquisador alertou para o problema do microplástico que, para ele, é muito mais lesivo do que as ilhas de lixo descartados a céu aberto. Animais e seres humanos estão expostos aos microplásticos de várias formas: pela água que consomem, pelo ar que respiram e pela alimentação. Já foram detectados microplásticos no coração, pulmão e sangue humanos e as consequências negativas para a saúde ainda não são de todo conhecidas, mas preocupam.
Desde 2022 tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 2524, conhecido como PL do Oceano sem Plástico, de autoria do ex-senador Jean Paul Prates (PT-RN), que propõe a redução gradual de plásticos descartáveis e pretende fazer com que todas as embalagens plásticas sejam retornáveis ou comprovadamente recicláveis até o fim de 2029.
O PL também reconhece a importância dos catadores na gestão de resíduos no país e a sua inclusão no Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais. A tramitação segue a passo de tartaruga, o texto ainda aguarda parecer na Comissão de Assuntos Econômicos, sob relatoria do senador Otto Alencar (PSD-BA), para seguir sua trajetória no Senado e na Câmara Federal.
O alerta de cientistas durante o encontro de Genebra, na semana passada, foi que, se não se alterar o cenário atual, até 2040 o volume de resíduos plásticos com descarte inadequado vai dobrar, com o aumento de até 70% na geração total desse tipo de lixo no mundo.
Se as negociações do pacto global estão emperradas, está nas mãos do Congresso a aprovação do PL 2524 que pode ajudar a promover uma economia circular do plástico. A proposta quer também proibir plásticos oxibiodegradáveis, a exemplo do que foi adotado na Europa.
Outra questão que os especialistas levantam é que as indústrias precisam redesenhar as embalagens para que haja viabilidade de elas serem totalmente recicladas. A dificuldade hoje, por exemplo, de reciclar uma garrafa de refrigerante é que ela é feita de materiais diferentes. A garrafa é PET, a tampa é de outro material plástico e ainda há o anel que veda a tampa e um rótulo. Não há máquina que desmonte isso na reciclagem, tudo é feito manualmente, uma a uma.
A reciclagem, por si só, não resolve a crise do plástico, mas há muito espaço para ela crescer no Brasil e no mundo. No nosso país, somente entre 3% e 4% dos resíduos são reciclados; no mundo, estão em torno de 9%. É questão de urgência a redução da produção e a substituição dos plásticos por materiais duráveis e retornáveis. E não dá para esperar por adesões voluntárias, tudo passa, obviamente, pela regulação estatal e pelo comprometimento das partes em viabilizar o que for aprovado.
E cada um de nós pode adotar ou continuar usando canudo de papel, sacola retornável e sapatos de brechó, sem perder de vista, porém, o Congresso Nacional e a sua obrigação de discutir e aprovar o PL do Oceano Sem Plástico. E de cobrar mais transparência e firmeza do governo brasileiro sobre o rumo que precisa dar a essa urgência ambiental global que não combina com titubeios ou omissão.
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