São de 30 dias atrás as primeiras notícias dando conta do gesto do prefeito de Cuiabá de intervir, pessoalmente, na representação do Brasão Oficial da capital ao criar a logomarca de sua administração.
Para diferenciar a identidade visual de sua gestão em relação à anterior, o atual prefeito confessou que mexeu na cabeça do pássaro (fênix) da parte de cima do Brasão de Cuiabá, mudando seu olhar para a direita, diferente da criação originária, que data de 1727, que o retrata mirando à esquerda.
O Brasão é um símbolo cívico que traduz a história e as características de cada município e do país. Junto com a Bandeira, o Hino e o Selo expressam a identidade, a evolução e as tradições e arte de um povo. São usados em eventos públicos, documentos e missões oficiais.
Em Cuiabá, o Brasão da cidade inspirou marcas de administrações passadas. Mas a atitude do atual gestor de fazer a inversão do olhar da fênix do Brasão para criar uma logomarca de seu agrado pode ser considerada inédita e ideológica. Pelo menos nas últimas décadas não se viu movimentos iguais ou próximos disso.
Assim, o capricho do gestor cuiabano, essa “vontade súbita de fazer algo de um determinado jeito”, combinado com seu posicionamento político, sabidamente de extrema-direita, é controverso, pois atinge um símbolo cívico, que é o Brasão, provocando polêmica em grupos de cuiabanos.
O Brasão de Cuiabá é de quando o Arraial, então integrante da Capitania de São Paulo, foi elevado à categoria de Vila, sob a denominação de Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá. Foi criado seguindo orientações da Coroa Portuguesa – um escudo dentro de um campo verde e nele um morro ou monte todo salpicado com folhetos e gravetos de ouro. Em cima do escudo, uma fênix.
Trinta dias atrás, as notas publicadas por veículos locais informavam que o prefeito da capital havia decidido fazer mudança do Brasão na logomarca de sua gestão. “A fênix estava olhando para esquerda e a gente colocou a fênix para olhar para a direita”, disse ele.
No período que se sucedeu a essas notícias uma das manifestações críticas ao gesto foi a do historiador Suelme Fernandes, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT).
No artigo intitulado Brasão de Armas de Cuiabá, posição contrária!, ele recordou que o ícone foi oficializado pela Lei N.º 592/61, mantendo as características originais de quando Cuiabá se tornou Vila. Lembrou que, em 1978, a Câmara Municipal quis fazer mudanças do Brasão, sem sucesso.
Portanto, alterações oficiais no Brasão, ou em outros símbolos cívicos, devem ser antecedidas por debates e aprovação na Câmara de Vereadores e até a realização de consulta popular, se for necessário, como nos advertiu Fernandes.
Mas no caso das logomarcas de gestão baseadas em tais referências, sejam elas nas esferas municipal, estadual ou federal, não há esse fator proibitivo.
O que se espera, todavia, é que os símbolos da cidade não sejam banalizados ao passarem por tantas modificações por conta do gosto e do espectro político do prefeito da hora.
“Acabam ficando sem a simbologia necessária ao que se quer simbolizar”, ressaltou à coluna Lúcia Helena Vendrúsculo Possari, professora-doutora em Semiótica da UFMT aposentada.
“Da forma como está sendo colocado é uma imposição, ou talvez um capricho de um pensamento nublado pelo oportunismo político”, pontuou à coluna o designer gráfico Javier Eduardo López, professor de Publicidade e Propaganda da UFMT.
Mesmo com o desconforto que a nova logomarca de gestão da prefeitura de Cuiabá, com olhar da fênix modificado, causa a grupos de cidadãos, nos quais me incluo, pode-se afirmar que a peça prosperou e foi além.
Ganhou concretude e sua aplicação já pode ser visualizada em carnês do IPTU e placas de lançamento de obras, como a de ampliação do Residencial Comodoro, em Cuiabá, apresentada em cerimônia realizada sexta-feira passada.
O que nos leva a reforçar a atenção quanto ao uso dos símbolos locais – o Brasão de Cuiabá é um deles, visto que trata-se de um ícone cultural que representa a identidade da nossa capital e não de uma pessoa seja ela comum ou pública.
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