Conflito ético na OAB-MT

Pedro Henrique Marques*
A Ordem dos Advogados do Brasil não é apenas uma entidade de classe. Conforme reconhecem a Constituição Federal e o Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/94), a OAB exerce papel institucional singular: defender a Constituição, os direitos humanos, a justiça social e a dignidade da advocacia.
Entre suas atribuições está o dever de proteger os advogados no exercício profissional, obrigação expressa no art. 44, II, do Estatuto. Esse dever não é facultativo. É legal. Quando crimes são cometidos contra advogados, a OAB deve agir: cobrar providências, resguardar prerrogativas e zelar pela integridade da profissão.
Contudo, situações recentes revelam colisões entre esse dever e interesses privados de dirigentes da entidade. Há casos em que escritórios ligados a membros da diretoria defendem investigados por homicídios de advogados, justamente nos procedimentos em que a OAB deveria estar exigindo justiça. Essa sobreposição de funções compromete a credibilidade institucional, gera insegurança e contamina investigações.
Em 2024, foi amplamente debatida, no contexto eleitoral da OAB/MT, a criação de um Plano de Defesa da Advocacia. A proposta foi concebida para assegurar proteção equivalente à conferida a juízes e promotores. Defendida pela chapa deste articulista, previa protocolos de segurança em parceria com autoridades. Apesar da relevância e do apoio recebido, foi ignorada pela gestão eleita. A classe segue desprotegida diante de ameaças crescentes.
O assassinato do ex-presidente da OAB/MT, em plena luz do dia, diante de seu escritório, é emblemático. O caso exigia resposta pública e institucional imediata. A omissão se agrava com a informação de que pessoas ligadas à direção atuam na defesa dos acusados. É inconciliável cobrar justiça e, ao mesmo tempo, patrocinar interesses de investigados. A legitimidade institucional exige coerência entre discurso e conduta.
Outro episódio grave envolve suspeita de venda de decisões judiciais, revelada após o assassinato de outro advogado. A gravidade dos fatos é evidente, e o discurso ético da OAB perde força quando dirigentes se associam a suspeitos de corromper o Judiciário.
Quem ocupa cargo diretivo na Ordem representa toda a advocacia. Por isso, assume compromisso ético adicional. O exercício dessas funções exige renúncias, inclusive na escolha de causas. Não se pode cobrar providências pela manhã e, à tarde, representar quem é acusado de matar um advogado.
A OAB não pode apenas bradar valores. Deve praticá-los. A advocacia espera uma instituição à altura de sua missão constitucional.
*Pedro Henrique Marques é advogado criminalista
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