COLUNA

Francisca Medeiros

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Informações que unem o campo e a cidade.

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Mudanças climáticas e o agro 

O aquecimento global é fato e não respeita fronteiras político-geográficas. E diante de sinais contundentes é perda de tempo negar sua existência ou concentrar energia em longas discussões para medir o quanto do fenômeno se deve a causas naturais e quanto à ação humana. O problema, que é considerado o maior desafio do século, requer enfrentamento.

E qual o papel da agricultura nesta questão que envolve cada habitante do planeta?

A agropecuária e outras formas de uso da terra representam em torno de 22% das emissões globais. Uma das plataformas de coleta de dados anuais brasileiros é o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), uma iniciativa do Observatório do Clima, que é uma rede da sociedade civil sobre a agenda climática com 70 integrantes. Os dados mais recentes mostram que em 2020 a agropecuária no Brasil respondia por cerca de 27% das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) e a maior parte disso, quase 70%, vinha da pecuária.

A agropecuária é o segundo maior emissor de GEE no país, fica atrás da mudança de uso da terra e floresta (46%), onde entra o desmatamento. Depois vem o setor de energia (18%), os processos industriais e resíduos (5%, cada). A poluição ambiental em outros países tem perfil diferente. O setor de energia é o maior emissor lá fora porque é baseado na queima de combustíveis fósseis. Por aqui as principais fontes energéticas são renováveis – hidrelétrica, solar, eólica, biomassa.

No cenário mundial, o Brasil responde por cerca de 3% das emissões dos gases nocivos, como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso. China, Estados Unidos, Índia, União Europeia, Indonésia e Rússia poluem mais que o Brasil.

Estas emissões mais intensas que recobrem a Terra retêm mais o calor do sol, elevando as temperaturas. Com o aquecimento global os padrões climáticos estão mudando. Há alteração no regime de ventos, na temperatura das águas dos oceanos e nas chuvas. Enchentes, secas, geadas intensas e tornados são frequentes e devastadores. Mais quentes, as cidades tornam-se desconfortáveis e surgem mais doenças. E sob estresse térmico e hídrico as plantas e animais não se desenvolvem bem. O calendário agrícola é alterado; não se sabe mais quando plantar, nem se haverá colheita. Toda a vida se ressente.

A percepção da gravidade do problema e as consequências para a agropecuária foram captados pela pesquisa Farmer Voice, divulgada em setembro pela Bayer. No primeiro semestre deste ano, a pedido da indústria alemã, uma agência independente ouviu produtores de oito países, entre eles o Brasil. O resultado mostrou que 71% dos entrevistados revelaram já ter sofrido impacto na atividade em função das mudanças climáticas. Quase 16% tiveram redução nos rendimentos. E atenção para um sinal positivo de reação: 80% disseram que já estão tomando ou planejam adotar medidas para reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa.

Outro estudo do início deste ano feito pela consultoria e auditoria Ernst & Young ouviu investidores do agro – donos, CEOs e acionistas de empresas do setor – no Cone Sul (Brasil, Argentina e Chile) para saber o que eles consideravam como principais riscos para investimentos.  As transformações nos padrões de temperatura e clima apareceram no topo; 47% dos investidores disseram que reconsiderariam investimentos com base neste critério.

Se é parte do problema, a agricultura é também exemplo de soluções. Mesmo porque a chamada “indústria a céu aberto” é dos setores mais vulneráveis aos extremos climáticos. Do ponto de vista tecnológico, há avanços consideráveis. Em vez de abrir novas áreas, busca-se mais produtividade. Segundo a Conab, em 40 anos a área de grãos cresceu 81% no Brasil, enquanto a produção saltou 433%.

Além de produzir alimentos e fibras, o agro também ajuda a diminuir a dependência dos combustíveis fósseis. E neste quesito o Brasil está à frente. Vêm do campo a cana e o milho usados na fabricação de etanol; também a soja, o girassol, o amendoim, a palma, de onde se retira o biodiesel que, depois, é misturado ao diesel.

Diante de um problema global, as saídas estão além das porteiras também. É missão da sociedade civil e dos governos. Entre 30 de novembro e 12 de dezembro as atenções do mundo estarão nas discussões da COP 28 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Nesta Conferência de Mudanças Climáticas vai ficar claro o que até agora é promessa e o que é ação dos países-membros da ONU para cumprir o compromisso de manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C até 2050.

Aqui um parêntese: curioso a COP ser sediada por um dos maiores produtores de petróleo, não? Pesquisei um pouco sobre a posição dos Emirados Árabes Unidos em relação aos compromissos da COP. Em julho o governo daquele país anunciou que planeja triplicar a oferta de energia renovável e investir US$ 54 bilhões nos próximos sete anos para atender às demandas de energia que são crescentes. E também prometeu apoio a projetos de combustível de hidrogênio de baixa emissão e o desenvolvimento de infraestrutura para carros elétricos.  Pretende ainda ser neutro em carbono até 2050. A ver.

As mudanças climáticas exigem que todos se mexam de forma articulada para encontrar saídas que não são simples e que devem ser multilaterais. Ninguém deve ficar de fora e não há tempo a perder quando tudo é urgente, quando tudo é para ontem.

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