COLUNA

Adriana Mendes

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Informações de política, judiciário e meio ambiente.

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Portão do Inferno e a campanha midiática

Foto: Sinfra/MT

Os desmoronamentos na região do Portão do Inferno – na estrada de Chapada dos Guimarães (MT 251) – são um problema desde a construção da rodovia, na década de 1970. É uma região de rochas frágeis e com camadas de arenito. A questão que impede uma solução para os desmoronamentos, mesmo depois de décadas, é política.

Em 2021, ignorando os problemas do local, o governo de Mato Grosso apresentou um projeto para a construção de uma passarela de vidro suspensa sobre o penhasco, visando a contemplação turística, apesar de já possuir informações sobre a instabilidade da área.

Em 2022, a Companhia Mato-grossense de Mineração (Metamat) realizou um estudo para prevenir tragédias como a de Capitólio, em Minas Gerais. O relatório,  que classificou a área como “de muito alto risco”, não resultou em medidas preventivas.

Com os desmoronamentos no final de 2023, a situação ganhou outra dimensão. No réveillon, a estrada foi parcialmente bloqueada, e posteriormente, a interdição passou a ser total por seis horas diárias. Como consequência, o turismo minguou, afetando economicamente a cidade.

Os interesses por trás dessas medidas são questionados por ambientalistas, que veem uma “estratégia midiática” para pressionar pela estadualização do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, proposta defendida pelo governador Mauro Mendes, mas sem progresso até agora. Ele tem adotado uma tática de críticas constantes ao ICMBio, órgão responsável pelo parque.

Na avaliação de Edilene Fernandes, consultora jurídica do Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), foram tomadas medidas tardias  para retirar o tráfego pesado de caminhões da estrada. “Isso deveria ter sido feito desde 2008”, critica.  Ela destaca que o governo estadual “não tem projeto pronto” para resolver o problema.

Já a Secretaria de Infraestrutura do Estado (Sinfra) informou que ainda está em elaboração um anteprojeto, previsto para ser concluído até o final do mês, para a construção de um túnel. A partir daí será contratada uma empresa para realização do projeto. Ou seja, o caminho escolhido pelo governo do estado para tentar resolver o problema é longo.

Um relatório recente, elaborado por uma consultoria, a pedido do governo, indicou mais uma vez o que todos sabem: há risco de desmoronamento. Será que o túnel é a melhor alternativa? Qual seria a solução mais rápida e eficaz?

Caiubi Kuhn, professor da Faculdade de Engenharia da UFMT e presidente da Federação Brasileira dos Geólogos (Febrageo), avalia que ainda existem muitos aspectos que precisam ser esclarecidos. “Eventuais mudanças de traçado da rodovia precisam de estudos e análises técnicas”, afirma.

A responsabilidade pelo trecho do Portão do Inferno é compartilhada: o governo estadual cuida da segurança e manutenção da estrada, enquanto o ICMBio gerencia o patrimônio ambiental e arqueológico.

O ICMBio autorizou obras emergenciais para instalação de telas metálicas de proteção, mas ainda não aprovou a remoção de blocos rochosos.Em ofício enviado à Sinfra e obtido pela coluna, o órgão solicita informações sobre a quantidade e o volume de blocos rochosos a serem removidos. Outra preocupação é com os dois sítios arqueológicos existentes nas imediações, já que as intervenções podem comprometer os registros.

Pegando carona na crise, o presidente do Tribunal de Contas do Estado, Sérgio Ricardo, comandou uma “vistoria técnica” no local, no último final de semana. Estiveram lá políticos e representantes de diversos órgãos:  Defesa Civil, Metamat, Crea, ICMBio e Ibama. Não é usual que o TCE fiscalize in loco as obras públicas. Embora devesse ser liderada pelo governo de Mauro Mendes, seus representantes atuaram como coadjuvantes.

O conselheiro chegou a pegar um pedaço da rocha do paredão para mostrar como ela se esfarela. O burburinho na imprensa não caiu bem para o governo, admitiram interlocutores do Executivo. Sérgio Ricardo afirmou que “o estado falhou” por não ter nenhum projeto.

“Chapada tornou-se uma cidade fantasma, não temos apoio de ninguém”, desabafou Gisele Carvalho, dona de uma pousada no local. Um protesto de moradores contra o fechamento da estrada aumentou ainda mais a pressão sobre o governador.

Essa situação levou o prefeito de Chapada, Osmar Froner, a fazer cobranças mais enfáticas a Mauro Mendes. Ele destacou que o governo “perdeu a oportunidade” de agilizar o licenciamento quando a Secretaria do Meio Ambiente (Sema) tinha a delegação de competência do Ibama, que foi encerrada em 2023. Isso quer dizer que, até o ano passado, o licenciamento seria liberado pela Sema e poderia acelerar o processo.

Mendes vai a Brasília nesta semana para reforçar junto às autoridades federais a campanha pela estadualização do parque. Em Chapada, a população está revoltada. Como não fez nada de concreto até agora para resolver o problema do Portão do Inferno, a estratégia midiática do governo pode ter sido um tiro no pé.

 

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