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Sem Justiça, a Advocacia morre

Mario Medeiros Neto*

Yuval Harari, historiador e escritor israelense, em seu best seller “Sapiens: Uma breve história da humanidade”, cita que um dos grandes saltos evolucionais do ser humano foi o desenvolvimento da capacidade de acreditar em algo não natural, como dinheiro, direitos, deveres e o Estado.

Exemplo banal, porém, ilustrativo e didático é o sinal vermelho. Por que você para no sinal vermelho? Não há nenhuma força natural que te faça parar no sinal vermelho. Você freia no sinal vermelho porque acredita que, ao ver o sinal vermelho, as outras pessoas pararão. É esta capacidade de acreditar em algo não natural que nos faz parar no sinal vermelho e avançar apenas no sinal verde, evitando acidentes e danos naturais.

A capacidade de acreditar em algo não natural nos concedeu uma evidente vantagem evolutiva, permitindo o desenvolvimento da nossa espécie e a vida em sociedade.

Por outro lado, a perda da capacidade de acreditar em forças não naturais nos involui, e dificulta a capacidade de viver em sociedade.

Uma força não natural, ao sofrer um ataque maciço e indiscriminado, perde a confiança da sociedade. O ser humano deixa de ser capaz de acreditar naquela força. Assim é com o Estado e mais especificamente com a Justiça.

Voltando ao semáforo, se todo mundo furar o sinal vermelho, ele não tem mais razão de existir, e acidentes acontecerão em larga escala.

Ao desacreditar da Justiça, o ser humano não mais recorrerá a ela para resolver as suas lides, involuindo enquanto sociedade e buscando métodos primitivos de solução de conflito, desaguando invariavelmente na violência e no uso arbitrário de suas próprias razões.

É inegável a crise institucional enfrentada pela Justiça. As instituições jurídicas são alvo cada vez mais frequente de acusações e críticas, que golpeiam sobremaneira a sua credibilidade.

Enquanto sociedade, e sobretudo enquanto advogados, por força também de juramento e obrigação legal, é nosso dever e nossa salvação defender a Justiça.

Não se olvide que a Justiça erra. Por má intenção ou por falha. Mas tais erros não podem ser colocados na conta da Justiça, sob pena de desacreditar uma força não natural essencial para a vida em sociedade e indispensável para a democracia.

Devemos lutar pelo fortalecimento da Justiça, e isto significa inclusive cuidar e tratar dos erros com energia e eficiência. Processando, julgando e punindo os responsáveis pelos erros, sejam eles advogados, servidores ou membros do Judiciário. Quem erra são as pessoas, não a Justiça.

É preciso uma postura austera, independente, corajosa, disposta a cooperar e a cobrar medidas eficazes na proteção da reputação da Justiça. Uma justiça célere, eficiente, correta e em que se possa confiar a pacífica solução dos conflitos individuais e coletivos, base da vida em sociedade e da democracia.

Pois, com uma Justiça desacreditada, a consequência é a violência e esta começa sempre contra o elo menos protegido, o que na Justiça equivale a dizer contra a advocacia.

*Mario Medeiros Neto é advogado.

 

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