COLUNA

Sônia Zaramella

soniaz@ehfonte.com.br

Relatos e fatos, pessoais ou não, do passado e do presente de Cuiabá e de Mato Grosso.

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No meio do calor, da queimada e da fumaça

Cuiabá (11/09) às 7h30 da manhã                                                                                                                                                             Foto: Adriana Mendes/eh fonte

Os cuiabanos nativos e na faixa dos 60+ lembram que, na infância, nossas mães costumavam, à tarde, passar pano bem úmido no piso de casa e jogar água nos cantos dos quartos para abrandar o calor na hora da sesta pós-almoço e melhorar o ambiente para dormir à noite.

Hábito dessa nossa Cuiabá tradicionalmente calorosa que, com o avanço tecnológico dos tempos recentes, foi beneficiada com a maciça presença de aparelhos de ar-condicionado, ventiladores potentes, climatizadores e umidificadores de ar de todos os tamanhos que ajudam a aliviar o calor aos seus moradores.

Mas, da mesma forma que avançaram os equipamentos e os ambientes refrigerados disponíveis na cidade, houve também, no tempo presente, expansão de suas áreas de concreto e de seus espaços de asfalto, o que não contribui em nada para um ambiente saudável.

Assim, no mesmo ritmo, aumentou o clima quente de Cuiabá, que viu ainda em seu espaço urbano reduzir drasticamente o verde das ruas e bairros e as mangueiras de seus quintais. A baixa umidade relativa do ar agravou as condições de seca na capital.

Alguns contemporâneos meus daquela época do pano úmido no piso, aos quais comento que a temperatura alta é a mesma de sempre, e que agora é a idade que pesa junto com o clima, insistem em me contradizer, afirmando que, atualmente, mesmo com todo suporte de equipamentos ao nosso dispor, o calor é mais avassalador.

Concordo com eles desde que se acrescente, ao instante atual, um fator que assusta e traz prejuízos à saúde, que é a fumaça tomando conta da cidade, oriunda das queimadas da própria Cuiabá, do seu entorno, ou de suas regiões próximas, como Pantanal e Chapada dos Guimarães.

O climatologista e doutor em meteorologia da UFMT, Rodrigo Marques, disse ao G1MT que, “na década de 1940 chegou a fazer um calor na faixa de 41ºC em Cuiabá” e que, “desde o início das medições, houve um aumento de pelo menos 3 ºC na máxima absoluta”.

Neste começo de setembro de 2024, a capital bateu um novo recorde de calor, registrando 42,8°C no domingo passado, a mais alta temperatura do país, e  42,6°C no sábado. “O motivo desse calor extremo é uma combinação de fatores – aquecimento global, localização e falta de vegetação na capital”, acrescentou o professor.

Com relação às queimadas, já numa visão estadual, Mato Grosso é o que mais queimou no país, com 36,4 mil focos de incêndios de janeiro deste ano até agora, conforme o Programa BDQueimadas do Inpe. Sexta-feira passada, o governo federal reconheceu emergência em 58 municípios do estado devido aos incêndios florestais.

Só no sábado (7), o Corpo de Bombeiros Militar registrou o combate a 43 incêndios. Na discussão do problema pelo STF, o ministro Flávio Dino, anteontem, disse que o país vive uma “pandemia de incêndios florestais” e determinou medidas para o enfrentamento às queimadas na Amazônia e no Pantanal.

Mas as chamas têm atingido vigorosamente também áreas do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães. Domingo passado, eu e um grupo de amigos passamos um ‘perrengue’ a uns 20 quilômetros do centro da cidade de Chapada por conta da seca, fogo e fumaça na região.

A combinação desses fatores forçou o recuo da permanência no local para o qual fomos e a escolha de outro lugar longe do fogo, que cedia um tempinho e logo depois refluía em labaredas altas ao longo da estrada. Isso sem falar no ambiente de fumaça o tempo todo, afetando o ar e os olhos.

Quanto ao calor, também convivi com ele no último fim de semana não em Cuiabá, mas ainda em Chapada, muito conhecida pelo seu clima agradável, principalmente nos meses de maio a julho, mas que agora também vem sofrendo com as mudanças climáticas.

Não só pela alta temperatura na cidade, mas ao ser embalada pela canção “Te ver”, cantada por Samuel Rosa, no show que fez durante o Festival de Cerveja Artesanal, realizado na praça dos Festivais da cidade, no sábado, e assistido por centenas de cuiabanos.

“É um momento histórico, preparem-se, vou repetir – Te ver e não te querer, é improvável, é impossível, é como não sentir calor em Cuiabá”, entoou alto Samuel Rosa, agora com carreira solo. Em vídeo do YouTube, ele recordou que essa canção, com música dele e letra de Chico Amaral, tornou o ex-grupo Skank conhecido nacionalmente. Faz parte do álbum Calango.

“Te ver” foi lançada em 1994 e, incrivelmente, três décadas depois, ouvi-la na voz do Samuel associando “o improvável e o impossível” a “não sentir calor em Cuiabá “continua tendo um forte simbolismo.

Penso que meus contemporâneos estão com a razão pois no meio do calor, da queimada e da fumaça, além da seca, ou, em outras palavras, dentro dessa crise climática, eu e os amigos 60+ estamos, sim, bastante complicados.

*Os textos das colunas e dos artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do eh fonte

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