Proibição da marmita não passou de 11 dias

Foto: MPMT
Para os moradores em situação de rua de Cuiabá e os benfeitores que os assistem, foram 11 dias de perplexidade neste primeiro mês de 2025. Foi de 17 a 28 de janeiro o tempo em que circulou publicamente a ideia do novo gestor municipal de ‘proibir a distribuição de marmitas em locais públicos’ de Cuiabá, com a justificativa de que leis da vigilância sanitária desaprovam a distribuição de alimentos nas ruas.
Impedindo a comida para essas pessoas, de cima para baixo, Abílio Brunini pretendia, no exercício do poder, começar o enfrentamento dos moradores em situação de rua da capital, em torno de 1.500 pessoas. De forma categórica, comunicou, em 17 de janeiro: “não quero continuar com esse programa de entregar marmitas na rua, não quero nem que a sociedade continue”. Opa!
Quase no mesmo dia, a proposta do prefeito foi elogiada pela presidente da Câmara de Vereadores, Paula Calil (PL). Igualmente, a primeira-dama do estado, Virgínia Mendes, aplaudiu a medida. A primeira-dama de Cuiabá, vereadora Samantha Iris (PL), disse que a ideia “é encontrar um local adequado para acolher essas pessoas, oferecer alimentação, tratamento psicológico e social”.
Porém, em outra ponta, vozes discordantes da forma de enfrentar a questão dos moradores em situação de rua surgiram rápido também naqueles dias. “Não é cortando a alimentação que vamos tirá-los desses territórios, o que temos de atacar são as causas”, ponderou o desembargador Orlando Perri, do TJMT.
De São Paulo, onde atua na defesa de pessoas em situação de rua, crianças e adolescentes, o Padre Júlio Lancellotti considerou, via Instagram, “desumana” a ideia de Abílio de proibir as marmitas.
Em meio àqueles dias do anúncio da restrição à entrega da comida, aprovada por apoiadores do prefeito, e de confusão, dúvida, hesitação e espanto, por parte da sociedade cuiabana em geral, surgiu um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) oriundo da polêmica.
O TAC “é um acordo que o Ministério Público celebra com o violador de determinado direito coletivo. Tem a finalidade de impedir a continuidade da situação de ilegalidade, reparar o dano ao direito coletivo e evitar a ação judicial”.
Desse modo, um TAC foi aplicado ao prefeito de Cuiabá para impedi-lo de interferir na entrega de comida nas ruas da cidade. Foi assinado no dia 28 de janeiro entre o MP de Mato Grosso e o Município de Cuiabá, visando “garantir o respeito à segurança alimentar da população em situação de rua na capital”.
O TAC pode ser usado em diversos contextos. O MP Estadual agiu rápido no caso das marmitas em Cuiabá. O mesmo Termo estabelece ainda que a Prefeitura apresente, até 28 de março próximo, o diagnóstico sobre a população em situação de rua na capital, além do plano de ação relacionado à execução da política pública em benefício dessa população.
Segunda e terça-feira desta semana, pós-TAC, portanto já minimizados os efeitos da malsucedida proibição da distribuição das marmitas, vista por muitos cuiabanos como desumana e hostil, visitei o centro histórico, região onde fica o Beco do Candeeiro, um dos locais de concentração dos moradores em situação de rua da cidade.
Na rua 7 de Setembro, passei pela Igreja Nosso Senhor do Passos e visitei, no casarão do lado, tombado pelo IPHAN, assim como a igreja, as Missionárias da Caridade, congregação religiosa católica concebida e fundada por Santa Teresa de Calcutá. No local, em todos os dias do mês de janeiro deste ano, a comida não deixou de ser ofertada aos moradores em situação de rua um dia sequer.
Visitei o Museu de Imagem e Som, na rua Voluntários da Pátria, só mesmo para ‘assuntar’ um pouco mais o tema, pois lá não é espaço usado para assistência, e também a histórica casa do professor Pedrinho (Pedro Celestino Barros Brito), com quem não pude conversar, visto que se encontra adoentado.
Também entre 11h e 11h30, notei a movimentação das pessoas na lateral da subida do Morro da Luz, na ilha da Banana, à espera do caminhãozinho que chega diariamente com as marmitas do almoço e faz ali a distribuição delas.
De modo geral, me pareceu que os moradores em situação de rua do centro histórico continuam sendo alimentados, sem restrições, sinalizando que a ‘bravata’ da proibição não funcionou.
Por ora, então, resta aguardar os 60 dias determinados pelo celebrado TAC para conhecer uma nova política pública em benefício dessa população.
Espero que seja transformadora e humanizada, não se limitando apenas à distribuição de marmitas. A ver!
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