Qual a vantagem do Acordo Mercosul-UE para o Brasil?
Já estamos em dezembro e o desejo do governo federal é de que o Tratado de Livre-Comércio entre Mercosul e União Europeia seja concluído ainda neste ano. Os otimistas torcem que isso se dê nesta semana numa reunião de cúpula do Mercosul, em Montevidéu. Os mais realistas acreditam que não há tempo para os ajustes necessários. Mas todos concordam que são grandes as chances de que o tratado, cujo texto foi fechado em 2019, ganhe finalmente sua versão final para, depois, ser avalizado pelos congressos nacionais de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai e pelo Parlamento Europeu.
O que prevê o acordo e o que ele pode mudar para o Brasil? A intenção é estreitar as relações comerciais e políticas entre os dois blocos, estabelecendo benefícios mútuos como a redução de tarifas, a regulamentação de padrões técnicos e compromissos sociais e ambientais. Um dos destaques da pauta são as máquinas e equipamentos e a ideia é que sejam importadas peças e conteúdos tecnológicos complementares à produção brasileira.
A Confederação Nacional da Indústria acredita que haverá mais oportunidades de negócios, abertura de novos mercados e criação de empregos. Um parâmetro divulgado pela entidade é que, cada bilhão de reais exportado para a UE em 2023 proporcionou a criação de 21,7 mil empregos, R$ 441,3 milhões em massa salarial e R$ 3,2 bilhões em produção.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada também fez um estudo que mostrou que a implementação do acordo Mercosul-UE beneficiará o Brasil com crescimento do PIB de cerca de US$ 9,3 bilhões até 2040, com aumento de 1,5% nos investimentos no período. O crescimento da produção do agro, em decorrência do acordo, deverá ser de 2%, ou US$ 11 bilhões, ao ano. Os setores que devem ser mais favorecidos são as carnes de suínos e aves, óleos vegetais e gado em pé.
A estimativa geral é que haja impacto em 90% do comércio entre os dois blocos, que representam um quarto do PIB do globo e envolve mais de 750 milhões de pessoas. Para se ter ideia das mudanças na prática, as empresas brasileiras poderão participar de licitações no bloco europeu. E vice-versa.
As negociações são complexas e envolvem diversas áreas, como tarifas alfandegárias, regras sanitárias e compras públicas. As questões agrícolas são, ainda, o maior calcanhar-de-aquiles. E, pela contrariedade do presidente Emmanuel Macron, percebe-se que produtos sul-americanos ameaçam os franceses, acostumados com o protecionismo de polpudos subsídios.
O argumento da França é que o país cumpre regras trabalhistas e ambientais mais rígidas do que os latinos e que, por isso, não consegue competir em pé de igualdade. Macron já disse que a importação de produtos sem tarifas não pode implicar na redução nos padrões de qualidade ambiental, social ou de saúde.
Com tradição mobilizadora aguerrida, os agricultores franceses pressionam com protestos públicos e fechamento de estradas. Em resposta ao mercado interno de seu país, grandes empresas francesas também ameaçam com restrições aos sul-americanos. Já se manifestaram neste sentido Danone, Os Mosqueteiros e Carrefour. O CEO global do Carrefour causou um barulhão nos últimos dias – quase um incidente diplomático – quando anunciou que não compraria carnes do bloco sul-americano porque os produtos, supostamente, não atenderiam às exigências e normas de qualidade exigidas pelo governo francês.
Governantes, entidades e empresas do agro e de outros setores brasileiros reagiram com firmeza e alguns frigoríficos deixaram de entregar carne para o Carrefour no Brasil, o que acabou levando o CEO, preocupado com os negócios em solo brasileiro, a enviar um pedido de desculpas ao governo brasileiro. Confirmou que a carne é ‘de alta qualidade, com respeito às normas e sabor’, mas não garantiu que vá comprar a nossa proteína para alimentar os franceses.
Além da oposição da França, o acordo enfrenta resistência da Irlanda, Polônia, Países Baixos, Áustria, Bélgica e Itália. Estes países alegam, de forma geral, preocupações com a sustentabilidade ambiental. Mesmo com estas discordâncias, o acordo pode avançar porque não é exigida unanimidade.
O tratado tem o apoio da Espanha, Portugal, Estônia, de parte dos países nórdicos e da Alemanha. Os alemães estão interessados em acessar especialmente matérias-primas sul-americanas importantes para a sua transição verde. Os produtos de peso nas exportações alemãs, como carros, maquinário elétrico e mecânico, chegarão ao Mercosul com preços mais competitivos.
A favor do acordo também conta a escolha do português António Costa para presidir o Conselho Europeu e da estoniana Kaja Kallas como representante da UE para Relações Internacionais. A alemã Ursula von der Leyen, que foi reconduzida por mais cinco anos à presidência da Comissão Europeia, é uma convicta defensora do acordo.
Sobre a Europa pairam dois fantasmas com poder de perturbar a economia: a volta de Donald Trump ao poder e a forte presença da China na América Latina. Entre 2020 e 2022 os investimentos chineses na região aumentaram 34 vezes. Por isso, a pressa de quem defende o acordo Mercosul-UE para que tudo se desenrole antes da posse de Trump na Casa Branca. Depois, aumenta a possibilidade de virem mais tempos protecionistas com a imposição de tarifas alfandegárias para a entrada de produtos estrangeiros nos Estados Unidos. O Mercosul, portanto, torna-se uma alternativa atraente para os europeus.
Aguardemos o que sairá da reunião de cúpula do Mercosul nesta quinta e sexta-feira; poderá ser notícia que também vai mexer muito com a economia brasileira.
*Os textos das colunas e dos artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do eh fonte.
Compartilhe
Assine o eh fonte
Tudo o que é essencial para estar bem-informado, de forma objetiva, concisa e confiável.
Comece agora mesmo sua assinatura básica e gratuita: